“As periferias do nosso tempo: Os velhos”

O segundo encontro do Terraço em Diálogo foi no dia 29 de outubro. Propusemo-nos falar sobre o problema da justiça entre as gerações, particularmente sobre as formas de discriminação silenciosas e invisíveis que atingem os mais velhos neste início do século XXI. O mote foi, por isso, “As periferias do nosso tempo: os velhos”. Contámos com uma introdução da Helena Pereira de Melo, professora na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, e, para reagir questionando e induzindo o diálogo, com o António Cardoso Ferreira, médico de saúde pública.

A Helena situou o problema no quadro mais vasto daquilo que o direito designa como discriminação “em razão da idade”, que, apesar de atingir sobretudo os mais velhos, também atinge os mais jovens. Referiu, na sequência, o conceito de “idadismo” (tradução do inglês “ageism”), em causa, desde logo, nas intervenções em termos de controle da descendência – ao nível embrionário, portanto. Genericamente, preside a todas as formas de discriminação em razão da idade uma conceção de dignidade humana que submete o qualitativo ao quantitativo: interessa a adequação da pessoa aos padrões de produtividade, de eficácia, daquilo, afinal, que se considera ser a “mais valia” de cada um para uma sociedade do “descartável”, em que o ter e o poder criam a ilusão do ser.

Ficámos inteirados sobre o facto de, do ponto de vista do Direito, a justiça e a solidariedade entre as gerações não estarem ainda inteiramente inscritas na prática. Mesmo se, gradualmente, o Direito vem protegendo cada vez mais as pessoas, a discriminação em razão da idade não está, por exemplo, explicitada na Constituição Portuguesa nem consta ainda na última proposta de revisão constitucional.

Entre outros comentários e questões, o António colocou uma interpelação profunda sobre a forma como nos vemos enquanto idosos, em potência ou efetivos, na superação do dilema existencial entre o crescer e o declinar até à morte. Como superar o estereótipo do envelhecimento como declínio? – rematou.

O convite a que inscrevamos a vida na sua totalidade e com todas as tonalidades que assume impele-nos a organizar o tempo, a planificar, desde sempre, tempo para o lazer, tempo para os outros e para nós mesmos, educando as gerações mais novas para uma vida não utilitária.

Impõem-se para tal – acrescentava a Helena – medidas que permitam desenvolver o potencial de justiça no nosso país. O Direito deve centrar-se na criação, para cada um de nós, de condições ideais para que, na diferença, desenvolvamos a nossa personalidade, sem que o exercício de direito deva, por conseguinte, ser condicionado pela variável tempo.

Foi mais um Terraço em Diálogo, mais um momento de conspiração por uma sociedade mais justa, em que todos gozemos do direito à esperança.