Advento 2018

ADVENTO 2018

Esperar é um modo de chegares
                                                                                        Um modo de te amar dentro do tempo.
 
                                                                                                                                    Daniel Faria
 
 
 
 
 
 
 
Prepararmo-nos na Espera
 
“Tempo é dinheiro” – ouvimos (e repetimos), talvez não tanto nos discursos, mas, sobretudo, no modo de agir e julgar a realidade. Numa cultura que assim se constrói e cultiva, a espera é, com efeito, sinónimo de desperdício, de passividade inerte. 
 
Não raras vezes, a inevitabilidade da espera convida à distracção, para que, assim, o esperar seja mais suportável.  Todavia, envolvidos pela distracção, ignoramos a pre-para-(a)ção e acabamos correndo o risco de não viver em pleno ou de, na espera, não reconhecer o que esperávamos. 
 
Há, no entanto, outras formas de viver a espera. Reclamando a responsabilidade do esperar, tornamo-lo num processo activo que prepara e dá forma ao que nos rodeia e a nós próprios, para assim acolher o que vem. E como viver este processo activo da espera? Dito de outro modo, como preparar?
 
O tempo litúrgico do Advento convida-nos à construção deste espaço e recorda-nos o seu carácter fundamentalmente criativo.  A nossa proposta para este Advento é uma tentativa de resposta a este desafio: de que esperar o Natal é, também, prepararmos o que nos rodeia, a nós mesmos com os outros para o encontro com quem nos visita.
 
Será que estou preparada/o para receber o que espero?
Sara Reis e Sónia Monteiro

PREPARAR A CASA

Recolho as familiares caixas da arrecadação. Revejo as bolas, os enfeites, os presépios…

Antes de desempacotar e percorrer as rotinas anuais de decoração, quebro o hábito automático e talvez até inconsciente. Pergunto-me: o que define a minha casa?
(À parte daquilo que poderia constar de um folheto imobiliário.) O que faz dela “a minha casa”, e não
uma outra casa qualquer?

Descrevo-a como um lugar barulhento, silencioso? É um lugar de encontro e partilha? De recolhimento? As portas e as janelas estão mais vezes abertas ou fechadas? A que cheira? Quais as cores que sussurram pelos quartos? O que se ouve? O que sente quem lá acorda e quem a visita? …?

Pergunto-me ainda: o que gostaria que significasse a minha casa?
O meu desejo está longe ou perto da realidade?

Jesus nasceu numa manjedoura em Belém. Este ano quer nascer em minha casa. Está a casa preparada para o receber?

Nestes dias, (re)conheço a minha casa, desconstruo-a, remodelo-a, construo partes dela de novo… Penso não só nos enfeites que irão colorir o espaço, mas também em como a minha casa se manifestará estes dias.

 O astrónomo e a brisa da noite

  (Excerto)

“- Onde eu moro não brilham estrelas, a não ser quando o coração de algum homem se converte no amor. Nem há constelações, a não ser quando             dois ou mais se reúnem em Meu nome. Moro onde tu moras. Compreendes?
            – Tu moras onde eu moro?! Eu moro numa casa tão pequena e Tu és tão grande!
            – Só é grande quem se encaixa no pequeno por amor.
            (…)
            – Quero que amem a casa que vos dei. Quero que a contemplem e conheçam. Há nela recantos que ainda nem sonham que existem.”                In O Príncipe e a Lavadeira, de Nuno Tovar de Lemos, s.j.

Una Mattina, de Ludovico Einaudi (Para escutar)

Sugestão: Propomos, ao longo desta semana, a meditação destas palavras e sons em diferentes lugares da casa /quarto que habito. Desafiamos a que a meditação de cada lugar ganhe vida num gesto físico. Como? Pode ser de uma forma mais óbvia, por exemplo, fazendo com que todos sintam que a minha porta está aberta, escrevo “Bem vindo” do lado de fora. Ou pode ser de uma forma mais simbólica, que talvez só eu entenda, colocando num lugar estratégico um adorno natalício que para mim simboliza algo de específico.
Decoro ou redecoro assim a casa, aos poucos, saboreando cada detalhe.

 

 

Na semana anterior, decorei* o espaço exterior da minha casa. Mas o lugar que habitamos, inclui também o nosso interior. São espaços distintos, mas que não se separam. Esta semana, com efeito, o desafio é o de “decorar” o interior do lugar habitado. 

PREPARAR-ME … NA ESPERA

Como?

… como se o tempo da espera, nos convidasse a saborear a paciência da pergunta. 

Rainer Maria Rilke, numa das suas cartas ao jovem poeta Franz Kappus, propõe-lhe o desafio de esperar sem a pressão da resposta ou de um produto final:


                   “…tudo está em levar ao fim a gravidez e depois dar à luz. Deixar medrar cada impressão, cada semente de uma emoção, dentro de nós, no
                   escuro, no inefável, no inconsciente, inacessível ao próprio entendimento, e com profunda humildade e paciência aguardar a hora do parto de
                   uma nova claridade: só isso se chama viver artisticamente, tanto na compreensão quanto na criação. […]  amadurecer como uma árvore que
                   não apressa a sua seiva e permanece confiante durante as tempestades de Primavera, sem o temor de que o Verão não possa vir depois. Ele
                   vem apesar de tudo. Mas só chega para os pacientes, para os que estão ali como se a eternidade se encontrasse diante deles, com toda a 
                   amplidão e a serenidade, sem preocupação alguma.”


Preparar como quem saboreia a espera …
Birdsong, de Alex Heffes; intérprete: Regina Spektor (Para escutar) 

 

*Decorar é normalmente usado em dois sentidos que, aqui, se completam. Decorar no sentido de ornamentar, honrar, dignificar. E decorar enquanto aprender pelo coração, ou seja, guardar na memória. 

Sugestão: Propomos a repetição do texto e da música ao longo da semana. Na repetição (que nunca é mera reprodução do mesmo), algo novo se revela a quem se prepara. 

Vivemos em lugares habitados por infindáveis relações, que dão forma e cor à nossa vida e a esse lugar. São desde as pessoas mais próximas, família, amigos, colegas, a rostos menos conhecidos que cruzam os nossos caminhos todos os dias. Escreveu o poeta Daniel Faria: Não acredito que cada um tenha o seu lugar. Acredito que cada um é um lugar para os outros.Nesta semana, propomos que a nossa atenção se foque na preparação do lugar, das relações que dão vida à cidade, vila ou aldeia que habito com os outros. Juntemo-nos às multidões do Jordão, que perguntavam a João Baptista o que haviam de fazer para preparar o caminho do Senhor. Perguntemos também nós o que podemos fazer de concreto durante esta semana para preparar o lugar em que vivemos. 

Encher as casas, os edifícios, as árvores com as luzes de Natal é uma das formas de o fazer. Mas por que não preparar o lugar enchendo (também) de brilho e luz as minhas relações, os rostos conhecidos e desconhecidos que cruzo diariamente?

Mensagem [adaptada] do Profeta Sofonias para nos inspirar a cada manhã ao longo desta semana:

             Rejubila,
             solta gritos de alegria,
             Alegra-te e exulta com todo o coração,
            «Não temas!
             Não se enfraqueçam as tuas mãos!
             O Senhor, teu Deus, está no meio de ti
             Ele exulta de alegria por tua causa,
             pelo seu amor te renovará.
             Ele dança e grita de alegria por tua causa,
             como nos dias de festa.

When You’re Smiling (Louis Armstrong, 1929) (Para ouvir ao longo da semana)

Proposta para a 4ª semana do adventoPREPARAR O ENCONTRO

Cant 2, 8-14

Eis a voz do meu amado! Ele aí vem, transpondo os montes, saltando sobre as colinas. O meu amado é semelhante a uma gazela ou ao filhinho da corça. Ei-lo detrás do nosso muro, a olhar pela janela, a espreitar através das grades. O meu amado ergue a voz e diz-me: “Levanta-te, minha amada, formosa minha, e vem. Já passou o inverno, já se foram e cessaram as chuvas. Desabrocharam as flores sobre a terra; chegou o tempo das canções e já se ouve nos nossos campos a voz da rola. Na figueira comecam a brotar os primeiros figos e a vinha em flor exala o seu perfume. Levanta-te, minha amada, formosa minha, e vem. Minha pomba, escondida nas fendas dos rochedos, ao abrigo das encostas escarpadas, mostra-me o teu rosto, deixa-me ouvir a tua voz. A tua voz é suave e o teu rosto é encantador”.

(Para escutar)

FETSUM – Waiting for you 

You’ll know my intentions

Deep in your soul

’Cause every man is driven inside  

To show you a heart of gold

A true revelation 

requires no proof

You will know, you won’t doubt in your mind

It is something we’re chosen to do

Waitin’ for you and there’s no question

If it’s wrong or it’s right

As sure as the day brings the light

For you and I’ll be there 

Come rain or come shine

’Til the day that our love comes alive

We don’t need to mention

There’ll be perils ahead

And we know, we have bridges to cross

Let us wait till we get there instead

Some say dedication

Is the fabric of love

We all know, what ignites our hearts

It’s the spirit that takes over us

Waitin’ for you and there’s no question  

If it’s wrong or it’s right

As sure as the day brings the light

For you and I’ll be there 

Come rain or come shine

’Til the day that our love comes alive

(x2)

And I’ll be there on the day that you are coming

And I will wait until the day that you come running

(repeat)

Saberás as minhas intenções

no fundo da tua alma

pois cada homem é levado 

a mostrar-te um coração de ouro

Uma revelação verdadeira 

não necessita ser provada

e saberás, não terás qualquer dúvida

que é algo para o qual fomos escolhidos

À espera de ti e não há dúvida 

se está certo ou errado

tão certamente como o dia traz a luz

De ti, e eu lá estarei

faça chuva ou sol

até ao dia em que o nosso amor ganhe vida

Não é necessário mencionar

que haverá perigos mais à frente

e sabemos que teremos pontes para atravessar

mas vamos esperar até lá chegar

Alguns dizem que a dedicação

é o tecido do amor

como sabemos, o que incendeia o nosso coração

é o espírito que toma conta de nós

À espera de ti e não há dúvida 

se está certo ou errado

tão certamente como o dia traz a luz

De ti, e eu lá estarei

faça chuva ou sol

até ao dia em que o nosso amor ganhe vida

(x2)

E eu estarei lá no dia em que chegares

E eu esperarei até ao dia em que venhas correndo

(repete)

Não só na espera podemos reclamar a responsabilidade e a acção, mas também no encontro. Levantemo-nos, rejubilemos, vamos nós também ao encontro de quem vem, como os reis que seguiram a estrela. Com o nosso entorno, o nosso interior, e as relações que nos envolvem já decorados, deixemos que a luz que daí vem irradie para dentro e para fora.

Sugestão: Nestes dias de azáfama, impregnemo-nos em cada acção quotidiana ou festiva com a alegria e amor de quem antecipa o encontro esperado. Façamos também por envolver quem nos rodeia na nossa alegria, no nosso amor.,.

E, por fim, encontremos quem esperávamos, o menino Jesus – não só nos presépios, mas também dentro de cada um/a que nos rodeia.

FELIZ NATAL