tu que conheces as pedras
em que tropeçamos
ou em que fazemos os outros tropeçar
José Augusto Mourão
Brendan Bannon. Cabana construída por uma família de refugiados nos arredores do campo de refugiados de Dagahaley, no Quénia.
Este é um tempo favorável, um convite a dar passos mais lentos, encarando o que nos pesa, o que nos dói e o que nos perde como humanidade. Por isso mesmo, este é também um tempo favorável para redescobrir a esperança, para retornar.
Vamos, nesta Quaresma, propor semanalmente um momento de lentidão e de olhar mais aprofundado sobre a História que estamos a construir, para por tudo e todos rezarmos confiadamente e com tudo e com todos nos comprometermos. Para tal, teremos presente a Mensagem do Papa Francisco para a Quaresma e a Reflexão Quaresmal da Comissão Justiça e Paz
Que este tempo seja, pois, “como um retorno ao Pai” – repetimos as palavras do Papa Francisco como forma de convite e de desafio.
Seja de dia ou de noite
trago sempre dentro de mim
uma luz.
No meio do ruído e da desordem
trago silêncio.
Trago
sempre luz e silêncio.
(Anna Swir)
Notícia (7Margens, 11 de Março 2019, António Marujo).
Portugal irá acolher, nos próximos meses, 100 pessoas que estão em campos de refugiados na Grécia. A decisão, anunciada sexta-feira, dia 8, pelo Ministério da Administração Interna (MAI), surge de um acordo entre os governos de Portugal e da Grécia, que culmina, diz um comunicado do MAI, a articulação técnica entre os serviços de asilo grego e português e o entendimento político na sequência da visita que o ministro português, Eduardo Cabrita, fez à Grécia em Outubro último.
Nessa ocasião, Cabrita manifestou ao ministro grego da Política de Migrações, Dimitris Vitsas, “a disponibilidade de Portugal para, em resposta ao pedido do governo grego, acolher até cerca de mil refugiados que se encontram na Grécia – o país europeu que registou, no ano passado, mais pedidos de asilo per capita”, diz o comunicado citado. O acordo que formaliza os procedimentos necessários à transferência foi assinado esta semana entre o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (Portugal) e o Serviço de Asilo (Grécia) e prevê uma primeira missão de entrevistas a 100 beneficiários e requerentes de proteção internacional estão em campos de refugiados na Grécia. O processo, diz ainda a mesma fonte, já tem luz verde da Comissão Europeia e tem sido acompanhado pela Organização Internacional para as Migrações. Os refugiados continuam a ser demais, hoje, enredados nas mesmas burocracias desumanizadoras. A propósito, António Vitorino, director-geral da Organização Internacional das Migrações, no mesmo jornal e dia, dava uma entrevista, onde se dizia que “são 260 milhões as pessoas em trânsito no mundo, entre refugiados, migrantes económicos e deslocados no interior do mesmo país.”
Mateus 25, 31-46
Pois eu tive fome, e vocês me deram de comer; tive sede, e vocês me deram de beber; fui estrangeiro, e vocês me acolheram; necessitei de roupas, e vocês me vestiram; estive enfermo, e vocês cuidaram de mim; estive preso, e vocês me visitaram’.
Então os justos lhe responderão: ‘Senhor, quando te vimos com fome e te demos de comer, ou com sede e te demos de beber? Quando te vimos como estrangeiro e te acolhemos, ou necessitado de roupas e te vestimos? Quando te vimos enfermo ou preso e te fomos te visitar?’
“O Rei responderá: ‘Digo-vos a verdade: O que vocês fizeram a algum dos meus mais pequenos irmãos, a mim o fizeram’ (…). E o que vocês deixaram de fazer a alguns destes mais pequeninos, também a mim deixaram de fazê-lo’.
Silêncio
Sinfonia das Sorrowful Songs, de Gorecki.
Da Reflexão Quaresmal de 2019 da Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP)
[O Papa fala da] Quaresma como um “itinerário de preparação” para a Páscoa que ano após ano percorremos. Preparação, segundo o dicionário, quer dizer “obra prévia”. “Convertei-vos!” (Mt 3, 2). Somos convidados a fazer alguma coisa para entrarmos na Páscoa. Francisco convida-nos a não desperdiçar “este tempo favorável” (…) e a perguntarmo-nos a nós próprios: “A própria criação pode também fazer Páscoa” (Ap. 21, 1)
“Que fizeste do teu irmão?” (Gn. 4, 9)
“Onde está o teu irmão”? Que “obra prévia” podemos nós fazer durante esta Quaresma?
Os que morreram
não se retiraram.
Eles viajam
na água
que vai fluindo.
Eles são a água que dorme.
(Da tradição africana, cit. em Mia Couto: “O Outro Pé da Sereia”)
Da Reflexão Quaresmal da Comissão Nacional Justiça e Paz:
“Fechamento/Hospitalidade – Assistimos a um fechamento de fronteiras (…). Constatamos, impotentes, o reacendimento de movimentos nacionalistas. Face a estes movimentos os cristãos são convidados à hospitalidade. S. Paulo, na carta aos Hebreus lembra: “Não vos esqueçais da hospitalidade, porque por ela, alguns, não o sabendo, hospedaram anjos”. Hospitalidade implica receber o outro como igual: no acolhimento do outro eu aprendo a reconhecer-me a mim próprio/a. A hospitalidade é incondicional e implica uma disposição interior aberta e irrestrita. Criemos cadeias de solidariedade includentes, abertas aos migrantes, aos refugiados que buscam uma vida melhor e mais segura. No acolhimento do outro eu aprendo a reconhecer-me a mim próprio/a. Deixemos que uma hospitalidade global prevaleça no nosso quotidiano”.
Notícia do Expresso de Sábado, 16 de Março 2019 (adaptada).
“Até ao fim do mundo. A fuga de mais de 740 mil pessoas da minoria étnica muçulmana rohingya de Myanmar [mais de 1/3 da população do Estado de Rakhine), vivendo na Birmânia desde o século XIX e sem conseguirem obter um simples cartão de cidadão], fez com que nascesse no sul do Bangladesh o maior campo de refugiados do mundo. Em apenas três meses. São hoje 1,2 milhões de pessoas dependentes de assistência humanitária. Estes números catapultaram o Bangladesh para o topo mundial das crises humanitárias, sendo que este país é um dos mais pobres do mundo.[1] A primeira ministra do Bangladesh, assinou acordos de repatriação com Myanmar (antiga Birmânia, de tradição budista) que não estão a ser cumpridos. A Human Rights Watch acusa Myanmar de ter realizado uma limpeza étnica, incriminando este país de crimes contra a humanidade”.
Silêncio
Que fizeste do teu irmão? (cf Gén. 4, 9); Onde está o teu irmão? Serão os Rohingya nossos irmãos, tal como tantos cristãos perseguidos em outras partes do mundo? Ou a “ajuda aos que sofrem” não é suficientemente ‘católica’ para abranger todos? Na sua etimologia a palavra ‘católico’ vem do grego kata (junto) e holos (todo), isto é: universal, que abrange tudo e reúne a todos”.
Silêncio
Salmo 129 [130]
Do profundo do abismo clamo por Vós, SENHOR!
Senhor, escuta a minha voz.
Estejam os teus ouvidos atentos
à voz da minha súplica!
Se tiveres em conta as nossas faltas,
Senhor, quem poderá salvar-se?
Mas em Vós está o perdão;
Para vos servirmos com reverência.
Eu confio no SENHOR,
A minha alma espera na sua palavra.
A minha alma espera pelo Senhor,
mais do que as sentinelas pela aurora.
(…)
[1] O Bangladesh é o 8.º país do mundo com mais habitantes. Uma parte grande da população sofre de subnutrição crónica. De acordo com dados divulgados em 2010 pela Organização das Nações Unidas (ONU), o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Bangladesh é baixo, com média de 0,469, ocupando o 129° lugar no ranking mundial (composto por 169 nações).
Estou eu quase tão destruído quanto a minha cidade
(Mia Couto)
Ciclone Idai em Moçambique: as imagens da destruição (uma manta de retalhos com notícias…)
Com ventos até 170 km por hora e chuva forte, o ciclone Idai varreu Moçambique e destruiu grande parte da cidade da Beira, a quarta maior daquele país. 90% da cidade da Beira está destruída.
O balanço provisório aponta para quase 300 mortos, mais de um milhar de desaparecidos e um cenário de completa destruição: casas arrasadas, famílias separadas, infraestruturas médicas afetadas e um elevado risco de propagação de doenças.
As estimativas iniciais do Governo de Moçambique apontam para 600 mil pessoas afetadas, incluindo 260 mil crianças (…). Segundo a ONU, este foi o pior desastre desde sempre no hemisfério sul e estão 1,7 milhões de pessoas em risco na zona de África atingida pelo Idai.
São as comunidades rurais as mais afetadas e sabe-se pouco do que se passa porque as comunicações estão destruídas, nomeadamente nas aldeias mais isoladas: “Ajudem-nos (…) porque nós gostamos de viver” afirma uma mulher numa machamba. E contemplamos igualmente as imagens de uma mulher que dá à luz no cimo de uma árvore…
Silêncio (enquanto nos deixamos interpelar pelas imagens em baixo)
Da Encíclica Laudato Si’, Papa Francisco
“Que tipo de mundo queremos deixar a quem vai suceder-nos, às crianças que estão a crescer? Esta pergunta não toca apenas o meio ambiente de maneira isolada, porque não se pode por a questão de forma fragmentária […] Para que viemos a esta vida? Para que trabalhamos e lutamos? Que necessidade tem de nós esta terra? […] Se não [nos colocarmos esta] pergunta de fundo, não creio que as nossas preocupações ecológicas possam surtir efeitos importantes”.
Da Reflexão Quaresmal da Comissão Nacional Justiça e Paz
Exploração/respeito pela criação – Etimologicamente, a palavra “respeito” corresponde à «ação de olhar para trás: consideração, atenção, acolhida, refúgio». Que fizemos da criação? O ser humano não é o senhor absoluto da criação, usando-a apenas em benefício próprio. Vivemos na permanente ameaça das alterações climáticas causadas pela sofreguidão dos homens e das mulheres. Quem paga são os mais pobres, os menos protegidos, os mais vulneráveis. Estamos a transformar o jardim do Éden num deserto. Prevalece a lei do mais forte sobre o mais fraco. Citando o Apocalipse o Papa afirma que a própria criação pode também “fazer Páscoa”: abrir-se para o novo céu e a nova terra (cf. Ap 21, 1). Trabalhemos para a Páscoa da criação.
São os mais pobres os que mais sofrem, afirma o Papa Francisco. Como podemos “fazer a Páscoa” à medida que vão passando as semanas da Quaresma? O que podemos fazer para que Moçambique tenha a sua Páscoa?
Silêncio
Do Livro do Êxodo 6,2-13
Moisés estava a apascentar o rebanho de Jetro, seu sogro, sacerdote de Madian. Conduziu o rebanho para além do deserto, e chegou à montanha de Deus, ao Horeb. O anjo do SENHOR apareceu-lhe numa chama de fogo, no meio da sarça. Ele olhou e viu, e eis que a sarça ardia no fogo mas não era devorada. Moisés disse: «Vou adentrar-me para ver esta grande visão: por que razão não se consome a sarça?» O SENHOR viu que ele se adentrava para ver; e Deus chamou-o do meio da sarça: «Moisés! Moisés!» Ele disse: «Eis-me aqui!» Ele disse: «Não te aproximes; tira as tuas sandálias dos pés, porque o lugar em que estás é uma terra santa.» E continuou: «Eu sou o Deus de teu pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacob.» Moisés escondeu o seu rosto, porque tinha medo de olhar para Deus. O SENHOR disse: «Eu bem vi a opressão do meu povo que está no Egito, e ouvi o seu clamor; conheço, na verdade, os seus sofrimentos. Desci a fim de o libertar da mão dos egípcios e de o fazer subir desta terra para uma terra boa e espaçosa, para uma terra que mana leite e mel (…). E agora, eis que o clamor dos filhos de Israel chegou até mim.
(…) Moisés disse a Deus: «Eis que eu vou ter com os filhos de Israel e lhes digo: ‘O Deus dos vossos pais enviou-me a vós’. Eles dir-me-ão: ‘Qual é o nome dele?’ Que lhes direi eu?» Deus disse a Moisés:«EU SOU AQUELE QUE SOU.» Deus disse ainda a Moisés: «Assim dirás aos filhos de Israel: ‘O SENHOR, Deus dos vossos pais, Deus de Abraão, Deus de Isaac e Deus de Jacob, enviou-me a vós: este é o meu nome para sempre, o meu memorial de geração em geração’.
Silêncio
Oração:
Cântico das Criaturas (S. Francisco de Assis)
Altíssimo, omnipotente, bom Senhor,
a ti o louvor, a glória, a honra e toda a bênção.
A ti só, Altíssimo, se hão-de prestar
e nenhum homem é digno de te nomear.
Louvado sejas, ó meu Senhor, com todas as tuas criaturas,
especialmente o meu senhor irmão Sol,
o qual faz o dia e por ele nos alumias.
E ele é belo e radiante, com grande esplendor:
de ti, Altíssimo, nos dá ele a imagem.
Louvado sejas, ó meu Senhor, pela irmã Lua e as Estrelas:
no céu as acendeste, claras, e preciosas e belas.
Louvado sejas, ó meu Senhor, pelo irmão Vento
e pelo Ar, e Nuvens e todo o tempo,
por quem dás às tuas criaturas o sustento.
Louvado sejas, ó meu Senhor, pela irmã Água,
que é tão útil e humilde, e preciosa e casta.
Louvado sejas, ó meu Senhor, pelo irmão Fogo,
pelo qual alumias a noite:
e ele é belo, robusto e forte.
Louvado sejas, ó meu Senhor, pela nossa irmã a mãe Terra,
que nos sustenta e governa, e produz variados frutos,
com flores coloridas, e verduras.
Louvado sejas, ó meu Senhor, por aqueles que perdoam por teu amor
e suportam enfermidades e tribulações.
Bem-aventurados aqueles que as suportam em paz,
pois por ti, Altíssimo, serão coroados.
(…)
Bem-aventurados aqueles que cumpriram a tua santíssima vontade,
porque a morte não lhes fará mal.
Louvai e bendizei a meu Senhor, e dai-lhe graças
e servi-o com grande humildade…
No meio das dificuldades atuais, quando muitas vezes a desconfiança parece ganhar terreno, teremos juntos a coragem de viver a hospitalidade e, assim, aumentar a confiança?
( Irmão Alois, prior da Comunidade de Taizé)
Foto: Journal L´Humanité acolhimento de imigrantes em Ivry (France)
Da Carta de Paulo aos Filipenses (4, 4-9)
Alegrai-vos sempre no Senhor! De novo o digo: alegrai-vos! Que a vossa bondade seja conhecida por todos. O Senhor está próximo. Por nada vos deixeis inquietar; pelo contrário: em tudo, pela oração e pela prece, apresentai os vossos pedidos a Deus em ações de graças. Então, a paz de Deus, que ultrapassa toda a inteligência, guardará os vossos corações e os vossos pensamentos em Cristo Jesus.
De resto, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é nobre, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é respeitável, tudo o que possa ser virtude e mereça louvor, tende isso em mente. E o que aprendestes e recebestes, ouvistes de mim e vistes em mim, ponde isso em prática. Então, o Deus da paz estará convosco.
Do livro de Hélia Correia, Um Bailarino na Batalha [1] (por T. Vasconcelos in: 7Margens)
[Este livro] descreve uma espécie de “peregrinação” de um grupo de refugiados Africanos em direção à “terra prometida” – neste caso a Europa – onde nunca chegarão: “Fogem da pátria? Tinham pátria? Tinham, pelo menos, povo,” afirmam: homens, velhos, mulheres e crianças. Caminhavam “num silêncio [que] era uma coisa como um tamanho”.
O tema não podia ser mais atual. Mas o que impressiona é que a escrita poética a que nos habituou Hélia Correia, venha tão cheia de compaixão – no sentido latino cum pacio, viver a paixão com – dando uma dramaticidade ao texto a ponto de nos doer. Hélia Correia como que acompanha o grupo, sentimos que ela faz parte do grupo, uma mulher caminhando com outras mulheres…
No relato aparece, dominante apesar do seu apagamento formal, um conjunto de mulheres:
Agora, graças a Miriam, as mulheres “têm uma cara e um nome”, afirma a autora (…). e prossegue: “Tinham ganhado um coração de nómadas”; “No entanto prosseguiam”.
A certa altura da sua “peregrinação” tomam consciência (…) de que a Europa não os quer, não lhes abrirá as suas portas. Buscam uma explicação: “é por isso que não nos querem lá. Paramos muito. Damos prejuízo. Paramos para rezar. Temos costumes”… E, no entanto, afirma Lídia Jorge, “necessitavam muito menos de um projeto do que de uma esperança. E a esperança precisava de um nome. Chamava-se Europa, a desejada, porque “ninguém vive sem terra prometida”.
O livro tem um final em aberto: não sabemos se chegam lá. A sua esperança vai-se convertendo em desespero, em escuridão, em perda. (…). O movimento profundamente empático de Hélia Correia convida-nos à descentração, a uma solidariedade entre iguais, à verdadeira hospitalidade… e à esperança!
Como podemos viver aqui e agora, nesta Quaresma, a hospitalidade? Será pela desconfiança, pelo medo, pela auto-centração? Como aumentar a confiança, a empatia com a dor do outro? Como partilhar mais do que temos e fazê-lo em silêncio e em alegria?
Da Reflexão da Comissão Nacional Justiça e Paz
Frugalidade/consumismo:
A mensagem do Papa convida-nos a que reaprendamos o sentido do jejum. Jejuar, segundo o Papa é «aprender a modificar a nossa atitude para com os outros e as criaturas: passar da tentação de “devorar” tudo para satisfazer a nossa voracidade, à capacidade de sofrer por amor, que pode preencher o vazio do nosso coração».
Somos bombardeados pela publicidade. No Natal passado gastámos como há muito tempo não gastávamos. Pensamos que a felicidade está no consumo e consumimos desenfreadamente em busca de sentido, caminhando de desilusão em desilusão. Centramo-nos na satisfação imediata. Francisco fala «de uma intemperança, levando a um estilo de vida que viola os limites que a nossa condição humana e a natureza nos pedem para respeitar, seguindo aqueles desejos incontrolados». Como passar para o outro lado? Para o lado de uma partilha responsável, de uma atenta solidariedade, na consciência de que os bens são limitados e devem ser distribuídos por todos. Como levar uma vida mais frugal naquilo que comemos, que vestimos, no lazer, nas coisas que temos? Como sermos frugais na competição desenfreada que nos consome? Como “emagrecer”? Como ultrapassar esta lógica do tudo e imediatamente, do possuir cada vez mais? Como ensinamos a frugalidade aos nossos filhos? Como dar lugar ao Ser em vez do Ter?
Minimalismo aparece como uma nova palavra, principalmente entre pessoas que já se cansaram do consumismo desenfreado e agora prestam um pouco mais de atenção a coisas que o dinheiro não pode comprar, como a satisfação com a vida e a felicidade. Nesta Quaresma prestemos atenção a esta palavra e pensemos como podemos ser “minimalistas”.
Do Salmo 33[34]:
Voltai-vos para [Deus] e ficareis radiantes,
O vosso rosto não se cobrirá de vergonha.
Este pobre clamou e o Senhor o ouviu,
Salvou-o de todas as angústias.
[1] Relógio de Água, 2018
Cristo, o Refugiado, o migrante, o “Homem de todas as dores”
Não deixemos que o medo nos impeça de acolher os refugiados – “Encontramos Jesus no pobre, no rejeitado, no refugiado. Não deixemos que o medo nos impeça de acolher o próximo necessitado”, afirma o Papa.
Francisco apelou já, durante o seu pontificado, a “uma gestão global e partilhada da migração internacional, apoiada nos valores da justiça, da solidariedade e da compaixão”, como recordou num encontro, na semana passada, entre o Vaticano e o México. Em várias ocasiões, o Papa pediu que o medo dos estrangeiros “não alimente o ódio e a rejeição” (Expresso 20.06.2018).
(foto: Berta Figueiredo)
Da Reflexão de Quaresma da Comissão Nacional Justiça e Paz
Balancear Individual/coletivo
Urge ultrapassar “comportamentos destruidores do próximo e das outras criaturas mas também de nós próprios”. A nossa sociedade individualista inscreve em nós uma auto-centração levando-nos a esquecer a nossa “circunstância”. Num movimento narcísico de contemplação de mim próprio, esqueço o perigo de me deixar apaixonar pela minha imagem. Esqueço a real interdependência de todos os seres humanos. O “Outro” compele-me, responsabiliza-me, ajuda-me a descentrar de mim próprio. Partilhemos, “na alegria de um coração purificado”. Sejamos solidários e partilhemos o que temos. Dar esmola é para que ultrapassemos a insensatez de viver e de acumular tudo para nós mesmos.
Direitos/responsabilidades
Este eu “autocentrado” esquece que não há direitos sem responsabilidades. Celebramos muito justificadamente a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Reafirmamo-la, mas ainda estamos longe de a cumprir em cada ser humano. Cedemos “à exploração da criação (pessoas e meio ambiente), movidos por aquela ganância insaciável que considera todo o desejo um direito e que, mais cedo ou mais tarde, acabará por destruir inclusive quem está dominado por ela” – afirma o Papa. Esquecemos que não há direitos sem responsabilidades. E a responsabilidade implica a atenção desvelada ao outro, a solidariedade, o movimento de apagamento da minha necessidade imediata para que o outro possa também usufruir da vida tal como eu usufruo.
Imagem que nos interpela
Junto à praça do município da Beira, alheia ao que se passa ao seu redor, Zinha tenta secar os seus livros uma semana depois de a sua casa, de construção precária, ter desabado. Para além da vontade de aprender, ela quer salvar o seu único bem: os livros de distribuição gratuita. (ver imagem em baixo)
Silêncio
Mateus 6:5-13
E, quando orardes, não sejais como os hipócritas; pois gostam de orar em pé nas sinagogas, e nas esquinas das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam a sua recompensa. Mas tu, quando orares, entra no teu quarto e, fechando a porta, ora a teu Pai em segredo; e teu Pai que tudo vê, te recompensará. E, orando, não useis de vãs repetições, como os gentios; porque pensam que pelo seu muito falar serão ouvidos. Não vos assemelheis, pois, a eles; porque o vosso Pai sabe o que vos é necessário, antes de vós lho pedirdes. Portanto, orai vós deste modo: Pai nosso que estás nos céus, santificado seja o teu nome; venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu; o pão nosso de cada dia nos dá hoje; e perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós também temos perdoado aos nossos devedores; e não nos deixes entrar em tentação; mas livra-nos do mal.
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