Na convicção de que a promessa se cumpre no desejo expectante que os acontecimentos em nós suscita, propomos para este Advento um exercício a partir da metodologia dos Círculos Bíblicos.
Os Circulos Bíblicos são uma dinâmica profética surgida no Graal em 1976, pela mão Teresa Santa Clara, a partir da convicção de que Deus é Acontecimento, se faz ao mundo (Emanuel) e é no mundo e através do mundo e, por isso, no tempo e em cada tempo, se dá a conhecer, se revela e nos desafia.
A proposta é a de uma leitura da vida e do mundo na e a partir da fé, esse filtro às vezes opaco, às vezes transparente, outras luminoso, que nos conduzirá a uma vida consentida e com sentido. Neste exercício constante, Deus connosco revela-se na bagatela do quotidiano, na sociedade contemporânea, poliédrica, multifacetada e secularizada.
Tratando-se de círculos, no plural, o convite é o de cada um e cada uma, a partir do lugar em que se encontra, formar um Círculo Bíblico ao longo deste Advento e desafiar aqueles que quiserem a tomar parte deste aprofundamento da fé e da cidadania ativa.
Rorate coeli desuper et nubes pluant justum
Aperiatur terra et germinet salvatorem”
Destilai, ó céus, dessas alturas, e as nuvens chovam justiça
abra-se a terra e produza a salvação”.
(Is 45,8)
Ne irascáris Dómine, ne ultra memíneris iniquitátis
Ecce cívitas Sancti facta est desérta
Sion desérta facta est, Jerúsalem desoláta est.
Domus sanctificatiónis tuae et gloriae tuae
Ubi laudavérunt Te patres nostri.
Não vos ireis, Senhor, nem vos lembreis da iniquidade.
Eis que a cidade do Santuário ficou deserta:
Sião tornou-se deserta;
Jerusalém está desolada.
A casa da vossa santificação e da vossa glória,
Onde os nossos pais vos louvaram
1 – Leitura da Vida
Tal como o herói de um Bildungsroman, tivemos de esperar por uma crise inesperada para descobrirmos a verdadeira extensão dos nossos poderes. A crise deixará cicatrizes, mas também acordará forças novas e insuspeitadas. A explosão de protestos públicos sobre injustiça racial em semanas recentes é apenas um exemplo — uma antecipação de outros movimentos que aí vêm.
Alguém disse uma vez que é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo. É uma formulação plausível, mesmo no seu efeito cómico. E, contudo, a atual crise provou o contrário.
(Bruno Maçães – Ex-Secretário de Estado dos Assuntos Europeus e Senior Fellow No Hudson Institute-, in Expresso, 19 Julho 2020)
Qual é a verdadeira extensão dos nossos poderes? O que fazemos com ela? Como?
Conseguimos listar os ‘contrários’ que esta crise provocou? E são ‘contrários’ a quê? Porquê?
2. Leitura da Palavra de Deus (Ev Marcos 13, 33-37)
«Tomai cuidado, vigiai, pois não sabeis quando chegará esse momento. É como um homem que partiu de viagem: ao deixar a sua casa, delegou a autoridade nos seus servos, atribuiu a cada um a sua tarefa e ordenou ao porteiro que vigiasse.
Vigiai, pois, porque não sabeis quando virá o dono da casa: se à tarde, se à meia-noite, se ao cantar o galo, se de manhãzinha; não seja que, vindo inesperadamente, vos encontre a dormir. O que vos digo a vós, digo a todos: vigiai!»
(Bíblia dos Capuchinhos online)
Neste tempo, em que o leitmotif é a vigilância, porque haveríamos de adormecer? Como? Porquê?
Jesus insiste com a palavra ‘vigiai’. O que é que esta vigilância tem a ver a connosco? Porquê?
‘Delegou a autoridade nos seus servos’ – que autoridade nos é dada? O que fazemos com ela? E o que é que a autoridade tem a ver com a vigilância?
Advento 2020
II Domingo
Rorate coeli desuper et nubes pluant justum
Derramai, ó céus, o vosso orvalho do alto,
e as nuvens chovam o Justo
Peccávimus et facti sumus tamquam immúndus nos,
Et cecídimus quasi fólium univérsi
Et iniquitátes nostrae quasi ventus abstulérunt nos
Abscondísti fáciem tuam a nobis
Et allisísti nos in mánu iniquitátis nostrae.
Pecamos e nos tornamos como os imundos,
E caímos, todos, como folhas.
E as nossas iniquidades, como um vento, nos dispersaram.
Escondestes de nós o vosso rosto
E nos esmagastes pela mão das nossas iniquidades
Rorate Caeli desúper et nubes plúant justum.
Derramai, ó céus, o vosso orvalho do alto,
e as nuvens chovam o Justo
1 – Leitura da Vida
Nove artistas mostram como é estar isolado mas debruçado sobre o mundo. Uma das primeiras exposições que, entre nós, mostra obras realizadas durante o lockdown e sob os seus efeitos.
A quarentena exigida pela pandemia não foi o primeiro momento de grande reclusão forçada a que a humanidade foi sujeita, mas foi aquele em que os meios de comunicação tecnologicamente disponíveis favoreceram mais paradoxos. Estar isolado e estar comunicante; em casa, mas a trabalhar, com tempo mas sem noção do tempo. Esse estado de exceção tinha de produzir consequências na própria experiência artística do mesmo modo que teve efeitos em quase todas as outras atividades, criando nuns condições para uma maior reflexibilidade e, simplesmente, bloqueando outros.
“Fazer de Casa Labirinto” é uma das primeiras exposições que, entre nós, mostra obras realizadas durante o lockdown e sob os seus efeitos. Comissariada por Ana Cristina Cachola e Sérgio Fazenda Rodrigues é uma mostra dispersa porque, além de refletir as contradições que enumerámos, remete para experiências singulares de adaptação.
(Celso Martins, in Expresso-cultura, 28 Setembro 2020)
Estamos de novo em lockdown. Como estamos a viver os paradoxos da reclusão: «estar isolado e estar comunicante; em casa, mas a trabalhar, com tempo mas sem noção do tempo»? Conseguimos nomear mais paradoxos? Na nossa vida pessoal? Na comunidade, no mundo? Quais?
Como descrevemos o labirinto das nossas casas?
2. Leitura da Palavra de Deus (Ev. Marcos 1, 1-6)
Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus. Conforme está escrito no profeta Isaías:
Eis que envio à tua frente o meu mensageiro,
a fim de preparar o teu caminho.
Uma voz clama no deserto:
‘Preparai o caminho do Senhor,
endireitai as suas veredas.’
João Baptista apareceu no deserto, a pregar um baptismo de arrependimento para a remissão dos pecados. Saíam ao seu encontro todos os da província da Judeia e todos os habitantes de Jerusalém e eram baptizados por ele no rio Jordão, confessando os seus pecados. João vestia-se de pêlos de camelo e trazia uma correia de couro à cintura; alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre.» (Bíblia dos Capuchinhos online)
O pecado é sempre um pedaço roubado à alma, ou …
O que é para nós o pecado? Como o definimos?
Iam ‘todos’ ter com João Baptista, a céu aberto no rio, ‘confessando os pecados’ – como lemos e entendemos estas palavras? Em tempo de lockdown que interesse poderá ter falar de ‘confissão dos pecados’ ou ‘remissão dos pecados?
abre os nossos sentidos, Deus,
à palavra nova que corre do mundo da promessa
e toca o lume da nossa expectação
José Augusto Mourão
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